15 de março de 2007

Revolução de Abril

O Estado Novo


“O que foi o Estado Novo, como começou, onde terminou?” são perguntas às quais precisamos de recuar até ao início do séc. XX para podermos responder.
Muitos foram os factores que levaram a uma sensação de crise nos meios políticos do nosso país na, chamada, ultima fase da I República. No Final da Primeira Grande Guerra encontramos um país com um sistema económico debilitado e constantemente desalentado com as várias tentativas frustradas de implantação de instituições republicanas. Como refere José Hermano Saraiva em História de Portugal, “de todos os sectores se pedia abertamente uma ditadura, isto é, um período de suspensão de normalidade constitucional para poder implantaras bases de uma vida política corrigida e renovada”. Nota-se aqui, uma vez mais, a vontade de uma reconstituição das estruturas e do próprio país.
Dois movimentos entraram em conjunção em Maio de 1926 e colocaram o comandante Cabeçadas na chefia. A 17 de Junho de 1926 um novo movimento militar (o primeiro tinha ocorrido no dia 6 do mesmo mês, onde uma dezena de milhares de militares irrompeu pela capital comandados pelo general Gomes da Costa), levado a cabo por tropas estacionadas à entrada de Lisboa, obrigou Cabeçadas (Chefe de Governo) a abandonar o posto. A 26 de Novembro, já depois do general ter sido deposto e enviado para uma prisão nos Açores, Carmona foi oficialmente declarado Presidente da República, já num sistema ditatorial. A perda de crédito dos partidos facilitava a vida à ditadura.
Um período de acalmia política, por esta altura, não trouxe melhorias significativas para a vida dos portugueses, e apesar do governo ter aproveitado este tempo para reformas internas, as verdadeiras preocupações centravam-se na situação financeira do país. Vários meses se passaram e pequenas medidas avulsas não iam resolvendo o problema. Até que em 27 de Abril de 1928 o Prof. António de Oliveira Salazar, docente na Universidade de Coimbra, aceitou o convite para preencher a pasta das finanças que se encontrava sem responsável. Se algum factor de escolha foi fulcral, sem dúvida que foi a sua vigorosa personalidade.
Na posse, Salazar, diria ao povo que teriam de saber obedecer quando fosse preciso obedecer. Os chefes militares foram os primeiros a apoiar este homem, pois viam nele uma forte estrutura para manter o regime de pé. Mas é o próprio a dizer em Outubro de ’29 que “tem a ditadura de dotar o país com um novo estatuto constitucional”. Como se desejava, a ditadura teria de ser temporária, e esta declaração vinha como uma premonição de um futuro não muito longínquo. Contudo, a transição da ditadura para uma nova ordem constitucional seria mais difícil do que inicialmente se esperava, ninguém sabia que estruturas governativas deveriam ser usadas.
No ano de ’32, Salazar discursava com vista ao fim do carácter militar da situação política. Dizia, então, que “ele (projecto de Constituição) procura construir (…) o Estado Novo que Portugal tem de ser”. Foi a 28 de Junho do mesmo ano que Oliveira Salazar foi apresentado como chefe do Governo, quando o presidente da República foi obrigado a convocar o Conselho Político Nacional devido à demissão do presidente do Ministério.
A 5 de Julho o Gabinete ficou estruturado com quatro catedráticos e nenhum general. Notava-se a vontade e preocupação de manter os poderes militares fora da política. Iniciava-se assim o projecto para um Estado Novo. E é em Março de 1933 que, sem partidos organizados, sem interlocutores políticos, nem oposição permitida, sem debate público, o projecto de Constituição foi submetido a um tipo de referendo. Contudo, o desinteresse político era de tal ordem que o governo viu-se obrigado a decretar que na contagem se considerasse a abstenção como voto afirmativo. Esta acção levantou grande contestação e reprovação, e contribuiu para o descrédito do «referendo». De imediato foi revogada essa medida por parte dos governantes. E a contagem final foram de 719.364 votos favoráveis, 467.179 abstenções e 5.955 negativos. A publicação dos resultados em 11 de Abril de 33 marca o início do período do Estado Novo.
A Constituição rege-se, principalmente, pelo ideal do nacionalismo, o culto à autoridade e pelo respeito à ordem pública e à ordem social.
Em termos de política interna o governo tentou “manter a casa arrumada”. A estabilidade política permitida pela permanência dos mesmos poderes possibilitou a execução de vários programas de reorganização em muitos dos domínios da vida nacional.
Dois anos depois, a lei de Reconstituição Económica revela o clima de estabilidade e confiança que o Governo quer implantar: 6,5milhões de contos durante um período de quinze anos, com vista à reorganização e rearmamento do exército, à construção de vias de comunicação, portos e aeroportos, construção de estabelecimento de ensino, etc. As novas possibilidades financeiras permitiam a aposta em obras públicas. Barragens e centrais termoeléctricas foram uma aposta para a ajuda do arranque industrial. O PIB progrediu incansavelmente devido, sobretudo, às melhorias da indústria. O contraste no nível padrão de vida nas cidades e nos campos manteve-se acentuado, assim como já vinha a ser desde a monarquia. Esta situação desencadeou um surto de emigração centralizada no interior português.
No entanto, toda esta reorganização assumiu aspectos mais vastos. Restrição à liberdade cívica. Estas repressões apresentavam-se em forma de Polícia (Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, Polícia Internacional e de Defesa do Estado, Direcção-Geral de Segurança). Estas polícias, ou polícia, de carácter político reprimia todas as actividades ilícitas ou que formassem oposição as ideias governamentais. O Partido Comunista Português foi um dos pilares que mais sofreu estas acções; e em forma de censura de imprensa, impedindo assim formações de ideias e ideais contrários aos do Governo. A apreensão de material impresso assim como a censura prévia aos artigos dos jornais eram as formas mais utilizadas neste tipo de repressão.
Inserido neste espírito de «ultra-nacionalismo», se assim posso apelidar, encontravam-se as normas da política externa. Portugal sempre esteve afastado do exterior numa tentativa de estabilizar a política nacional e mais tarde devido à má gestão desta própria política. Assim, entre os anos de ’36 e ’39 (Guerra Civil espanhola), ’39 e ’45 (Segunda Guerra Mundial), a partir de ’47 (após a independência da União Indiana), ’61 (O problema da Índia portuguesa) e entre ’61 e ’74 (Guerra Ultramarina) a política externa nacional não conseguiu responder às incidências. Mas, durante o grande período da segunda grande Guerra, Portugal manteve-se à parte num clima de paz, acarretando, como de esperar, as restrições que esta política trouxe.
O fim da Segunda guerra simbolizou a vitória da democracia e a condenação do totalitarismo. Em Portugal este desfecho foi aplaudido como o início de uma nova era, uma era de liberdade. O Estado Novo era agora visto como uma experiência que já dera tudo o que tinha, mas nunca esquecendo o magnífico trabalho nas áreas das finanças e Obras Públicas. Perante tanta pressão interna e externa ao governo, Salazar convoca eleições para Novembro de ‘45, referentes à Assembleia Nacional. Nesta altura surgem vozes contra o governo. As principais acusações centram-se na polícia política, censura à imprensa, proibição da formação de partidos, altos níveis de analfabetismo, atraso da Universidade e baixo nível do seu rendimento. Acusações estas ouvidas pelo grande público. Inicia-se um período de agitação política. Na noite de 10 de Outubro uma pequena coluna militar sai do quartel do Porto em direcção ao sul. Esta acção ficou conhecida como a revolução da Mealhada, local onde a coluna foi interceptada pelas tropas fiéis ao regime.
Em 1949 voltou-se a marcar eleições mas assim como em ’45 o candidato não se apresentou por não existir a garantia de democracia. As eleições de ’58 deram a vitória ao Almirante Américo Tomás. General Delgado acusou o governo de fraude eleitoral e foi obrigado a refugiar-se no Brasil.
Foi no Período ditatorial que se começou a usar a expressão Império Colonial para designar os países ultramarinos. Vários confrontos políticos tiveram lugar, no início, para defender aqueles territórios de outros países europeus, nomeadamente a França e Inglaterra. Mais tarde existiram grandes batalhas pela manutenção daquelas terras reclamadas pelos povos habitantes e principalmente pelas suas guerrilhas. Estas nasceram por altura da eleição de Kennedy para a presidência dos EUA. Foi em Março de 1961 que ocorreram as primeiras ondas de violência. Em ’63 a revolta chegou à Guiné. Muitos soldados morreram, muitos ainda sofrem os horrores da guerra.
Os adversários do Governo apresentam agora a mais forte acusação, a guerra colonial.
Salazar tenta, ainda, no verão de ’68 uma renovação dos seus ministérios colocando “sangue novo” numa tentativa de renovar o ritmo, pouco dias depois falece.
Para o seu lugar entra Marcelo Caetano. Era uma figura de grande prestígio e a troca não levantou ondas.
Os problemas continuavam e a esperança que M. Caetano conseguisse reacender a chama portuguesa foi-se desvanecendo. A questão fundamental continuava por resolver, a guerra colonial. A igreja começou a desligar-se do governo, as finanças começavam a dar problemas, as estruturas não estavam preparadas para a evolução do tempo.
Foi do exército que partiu, em 1974, a iniciativa que colocaria um ponto final neste longo capítulo da história lusitana.

joão pereira

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