9 de agosto de 2009

Os Aspectos Culturais Como Mote das “Lutas” Civilizacionais do Futuro

Este trabalho insere-se na cadeira de Teorias da Cultura do Mestrado de Jornalismo, leccionada pelo Dr. António José Ferreira Bento. O objectivo do mesmo é tentar perceber, tendo por base a obra O Choque das Civilizações, como serão os conflitos do futuro e que factores os irão inflamar.

O Choque das Civilizações e a Mudança da Ordem Mundia[1]l, de Samuel P. Huntington, é um dos mais provocantes ensaios dos últimos anos. Ao contrário do que alguns estudiosos defendem, as ideias de Huntington provocaram, realmente, inúmeras “reacções e comentários de todos os continentes e países. As pessoas ficaram assustadas e perplexas por a minha tese do conflito entre grupos de civilizações diferentes ser a dimensão central e a mais perigosa da nova política global”, garante o autor no prefácio da obra, referindo-se ao artigo intitulado «The clash of civilizations?»[2] publicado na revista Foreign Affairs, texto seu que surgiu como uma reacção ao livro de Francis Fukuyama The End of History and the Last Man[3] (1992). A expressão, “choque das civilizações” foi usada pela primeira vez por Bernard Lewis num artigo do exemplar de Setembro de 1990 de The Atlantic Monthly, chamado The Roots of Muslim Rage[4].

Samuel Phillips Huntington faleceu no passado dia 24 de Dezembro de 2008. Foi um cientista político muito influente nos círculos politicamente mais conservadores. Tornou-se conhecido pelas análises do relacionamento entre os militares e o poder civil, pelas investigações acerca dos golpes de estado e, principalmente, por esta polémica obra sobre a teoria do choque de civilizações, inspirada pelo historiador e filósofo Feliks Koneczny, segundo a qual os principais actores políticos do século XXI seriam civilizações e não os estados nacionais, e as principais fontes de conflitos após a guerra fria, não seriam as tensões ideológicas mas as religiosas. Foi professor de Ciências do governo em Eaton e director do Jonh M. Olin Institute para os Estudos Estratégicos da Universidade de Harvard.

Muitos acreditam que a política mundial encontra-se numa nova fase e a “fonte fundamental de conflito neste novo mundo não (virá a ser) prevalentemente ideológica ou predominantemente económica[5]”. No entanto, novas guerras têm surgido no século XXI que vêm solidificar as teses que defendem que as futuras batalhas serão pela obtenção de energia e alimentos. São exemplos a Guerra do Iraque, cuja invasão em 2003 iniciou-se através de uma aliança entre os Estados Unidos da América e Reino Unido. Mas também com o consentimento e apoio de outros países, nomeadamente Espanha e Portugal. O objectivo seria acabar com as, hipotéticas, armas de destruição maciça que o país possuiria.

França, China e Rússia e o Conselho de Segurança das Nações Unidas opuseram-se à Guerra de 2003, juntamente com a Alemanha, cujo Chanceler Gerhard Schröder ganhara as eleições gerais de 2002 prometendo aos alemães que o país não entraria num possível conflito.

Mas as vozes críticas da Europa não foram capazes de demover a intenção de W. Bush que aproveitou a invasão para controlar as vendas do petróleo daquele país. Já em 1990, uma coligação liderada pelos EUA (que era na altura presidido por Bush – pai), removeu as forças iraquianas do Kuwait e assegurou-se de que o Iraque não invadisse a Arábia Saudita. Comandado por Saddam Hussein, o Iraque tinha invadido o seu vizinho Kuwait. País rico em petróleo.

Já no início deste ano assistimos ao que a imprensa nacional e mundial apelidou de “Guerra do Gás”[6]. A Ucrânia e Rússia debateram (debatem), com prejuízo para a Europa, o estabelecimento de normas de controlo do transporte do gás russo através do seu território.

Mas assistimos igualmente a uma guerra, mal compreendida, na Faixa de Gaza, onde os israelitas pretendem controlar a região e impedir a criação de um possível país palestinianos.

Serão, então, os conflitos do futuro um espelho do passado, ou haverá mudanças nos motes dos choques civilizacionais?


Civilizações

O que Samuel Huntington defende é que “as grandes divisões existentes na humanidade e a fonte dominante de conflito serão culturais”[7]. Para Huntington, os Estado-nações[8] vão continuar a ter o papel principal nas questões mundiais, mas os agentes dos principais conflitos da política global passarão a ser as nações e os grupos de diferentes civilizações. Estes choques entre civilizações virão dominar a política global. “As guerras civilizacionais serão as batalhas do futuro”[9].

Será importante delinear o que se entende por civilização. O conceito de civilização prende-se com conjunto das instituições, técnicas, costumes, crenças, língua que caracterizam uma sociedade ou um grupo de sociedades determinadas. Uma civilização é, assim, uma entidade cultural. Sendo uma entidade cultural tem que ter obrigatoriamente uma identidade.

Mas as pessoas têm níveis de identidades diferentes: “um residente em Roma pode definir-se, em vários graus de intensidade, como romano, italiano, católico, cristão, europeu, ocidental”[10]. Para perceber a que civilização pertence o indivíduo teremos de referenciar “o mais elevado agrupamento cultural de pessoas e o nível mais amplo de identidade cultural”[11] que possuí.

De realçar que o conceito de civilização só foi firmemente estabelecido no final do século XVIII e só é utilizado, de facto, na reconstrução da realidade histórica, no século XIX. Antes, ser “civilizado” significava viver sob a lei. Na França a palavra foi utilizada no sentido de um bom governo, capaz de assegurar as instituições, mais precisamente, a ordem, a paz, a família, a propriedade, a justiça, tudo sobre o domínio da lei. Na Inglaterra, surgia, quase ao mesmo tempo, a expressão “refinado” que era a valorização dos costumes sociais, em que se destacava a polidez (polished), que enfatizava que devemos tratar os outros com respeito, ou civilidade. Esta civilidade era como um conflito amigável, que trazia consigo a tolerância pelas diferentes opiniões políticas, religiosas, etc.

Hoje em dia o conceito é já incorporado no “Manual de Sociologia” de Rumney e Maier: “civilização é o último estágio de cultura, isto é, não só a totalidade da cultura, mas, igualmente, o grau de adiantamento da vida de um povo e o controle exercido por este sobre o meio ambiente”[12].


Os Confrontos

É importante perceber o passado para podermos entender o futuro. Desde sempre que há registo de confrontos entre Homens. Até em passagens bíblicas se referenciam ataques. O primeiro de todos envolve dois irmãos, Caim a Abel. Terá sido a inveja o motivo do homicídio.

O milénio passado foi também recheado em confrontos. Com o conhecimento de novos mundos, os impérios, nomeadamente o português, tentaram projectar a sua cultura, os seus hábitos, a sua língua nesses lugares recém-descobertos. Quase sempre sobre a cruz do cristianismo. Sob essa mesma cruz foram mortos milhares de pessoas que não se sujeitaram às leis dos descobridores.

Mais recentemente temos nos livros da história a I e a II Guerra Mundial. A Primeira Guerra Mundial (também conhecida como Grande Guerra, Guerra das Guerras ou ainda como a Última Guerra Feudal) ocorreu entre Agosto de 1914 e Novembro de 1918. De um lado a Tríplice Entente (liderada pelo Império Britânico, França, Império Russo (até 1917) e Estados Unidos (a partir de 1917), do outro a Tríplice Aliança (liderada pelo Império Alemão, Império Austro-Húngaro e Império Turco-Otomano). Como resultado das disputas, o colapso de quatro impérios e mudança radical do mapa geopolítico da Europa e do Médio Oriente.

As causas para esta guerra são muito controversas. O único ponto aceite por todos é que em Junho de 1914, o arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do trono Austro-Húngaro, e sua esposa Sofia, Duquesa de Hohenberg, foram assassinados pelo sérvio Gavrilo Princip, que pertencia ao grupo nacionalista/terrorista armado Mão Negra, que lutava pela unificação dos territórios que continham sérvios. Tudo o que se passou a seguir ninguém sabe explicar bem. Pode-se considerar que a guerra teve fins económicos, mas seria muito vago quedar a explicação por aí. De uma forma básica poderá afirmar-se que a Primeira Guerra Mundial foi feita para pôr fim a todas as guerras.

Contudo, transformou-se no ponto de partida de novos e irreconciliáveis conflitos, pois o Tratado de Versalhes (1919) disseminou um forte sentimento nacionalista, que culminou no totalitarismo nazi-fascista.

A Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945) que opôs os Aliados às Potências do Eixo. As principais potências aliadas eram a China, a França, a Grã-Bretanha, a União Soviética e os Estados Unidos. A Alemanha, a Itália e o Japão, por sua vez, perfaziam as forças do Eixo. Adolf Hitler defendia que a Alemanha necessitava mais espaço e por isso pretendeu estabelecer uma fronteira com a União Soviética. Hitler partiu para a conquista de países vizinhos como a Áustria ou a Checoslováquia. Anexações que não mereceram resposta por parte das potências ocidentais europeias. Tal só viria acontecer quando Hitler avançou sobre a Polónia, iniciando-se a Segunda Grande Guerra.

Actualmente, as guerras que envolvem a tentativa de redefinição de fronteiras ou imposições religiosas são mal vistas e criticadas. Os discursos dos islamistas são constantemente desvalorizados, dando uma imagem de assassinos e terroristas aos que tentam pela força impor uma religião. Isto, quando foram os católicos que mais mataram em nome de Deus. O jornal italiano La Repubblica noticiava em Dezembro que “um grupo ligado à rede terrorista Al-Qaeda no Iraque difundiu uma mensagem na Internet na qual conclama «o novo chefe da Casa Branca e seus aliados cristãos» a «converterem-se ao Islão»”. E intitulava o periódico “Grupo extremista exige conversão de Obama ao Islão”.

Assistimos a uma repetição da história. Desta vez com outros protagonistas, noutros tempos, mas com os mesmos propósitos, com os mesmos motes: a religião. E se as repetições históricas forem cíclicas, a seguir às guerras religiosas (ou santas) teremos guerras de fronteiras.


O porquê das guerras futuras

Quando falamos em guerras religiosas não nos podemos esquecer que a religião é parte fundamental da identidade cultural de cada um. A guerra religiosa é na verdade uma guerra civilizacional.

No futuro, creio que não muito distante, a identidade civilizacional terá enorme importância uma vez que existem, actualmente, “sete ou oito grandes civilizações. Nestas incluem-se a ocidental, a confucionista (ou sínica)[13], a japonesa, a islâmica, a hindu, a eslavo-ortodoxa, a latina-americana e possivelmente, a africana”[14]. Neste aspecto saliento a minha não concordância com a classificação do autor. Nomeadamente com a classificação do Brasil como não fazendo parte da civilização ocidental, quando é já uma força expansionista em África e segue os padrões ideológicos americanos.

Continuamos, no entanto, a ter uma super-potência económica, os EUA. Mas ao mesmo tempo o mundo divide-se civilizacionalmente independentemente da força económica de cada região.

Como já abordei anteriormente, a seguir a guerras religiosas, a história mostra-nos que haverá lutas pelas fronteiras. “Os conflitos mais importantes do futuro ocorrerão ao longo das linhas que separam as civilizações umas das outras”[15].

Isto, porque existirão colisões/choques sobre a maneira de ver o mundo e sobre a maneira como o homem deve agir nele. As leis básicas da humanidade encontram-se na religião, mas existem tantos entendimentos sobre as leis, como religiões. Ambos os lados das fronteiras verão o seu opositor como bárbaro, ou não civilizado.

Com o avanço tecnológico torna-se mais fácil o contacto entre as civilizações. A este fenómeno o autor denomina de transformação do mundo “num lugar mais pequeno”. Este contacto mais aproximado permite que as diversas civilizações contactem e conheçam-se mutuamente. O que se por um lado permite o aumento de consciência enquanto à realidade mundial, por outro aumenta e acentua as diferenças civilizacionais.

A mudança económica e tecnológica mundial contribui também para afastar as pessoas das tradições, isto é, das suas identidades locais. O que provoca um enfraquecimento do sentimento colectivo e de unidade. Tem sido a religião, em muitos casos, a tentar tapar esse vazio, com movimentos que na maior parte das vezes são vistos como fundamentalistas.

Por outro lado, existe o receio que o Ocidente perca a posição dominante que tem. Várias vozes se levantam prevendo que a Ásia, nomeadamente o Japão e/ou a China, passe a ser em breve a próxima super-potência e a civilização mais forte, consequentemente. “Um Ocidente no auge do seu poder confronta-se com um poder não ocidental que, crescentemente, tem desejo, vontade e recursos para moldar o mundo em modos não ocidentais”[16].

As disputas futuras trarão também novas formas de definir aliados. “A questão principal nos conflitos ideológicos e de classe consistia em «de que lado estás?» (…) Nos conflitos entre civilizações a que questão que se coloca pretende saber «o que és?»”[17]. «Ser» no sentido de «que valores transmites», que «valores defendes». Exemplificando, mostro a eleição de Barack Obama. Para muitas pessoas é a oportunidade de América mudar a imagem. Mas há também aqueles que já afirmaram que Obama é agora, pura e simplesmente, o 44º presidente dos EUA. Aquele que liderará uma nação que tem de ser destruída, tornando-se o presidente como que uma «encarnação» de toda a cultura americana.

Por fim, haverá mais um factor que levará a confrontos. Factor que foi no passado o despoletar da 2ª Guerra Mundial: o “Regionalismo Económico”. A União Europeia é disso exemplo. O seu crescimento explica-se, sobretudo, pela cultura europeia que se foi criando, mas mais, ainda, devido à partilha do cristianismo ocidental. E actualmente, o alargamento desta área é condicionado por vários factores de integração. Não só económicos como também culturais. A Turquia tem sido o caso mais badalado, sendo a França um dos principais opositores à integração deste país.

O líder “árabe/líbio Moammar Kadhafi que, na altura da cimeira da UE de 16 Dezembro de 2004, onde esta aceitava abrir negociações de adesão com a Turquia numa entrevista à televisão italiana RAI, entendeu avisar os europeus que a «entrada da Turquia para a União Europeia, era um cavalo de Tróia», e que os extremistas em todo o mundo islâmico, incluindo Osama Bin Laden, estavam satisfeitos com essa adesão”[18].

Dificilmente a Turquia se tornará membro da União Europeia. E a razão centra-se em questões de identidade: «É que nós somos muçulmanos e eles são cristãos, mas isso não dizem», afirmava o ex-presidente turco Turgut Özal, no início da década de 90.

“Quais são os verdadeiros heróis nacionais que moldam a identidade do cidadão turco? Homero e São Paulo, como sugere Turgut Özal, ou Átila, Alparslan, Gengis-Khan (em termos étnicos) e o Profeta Maomé (em termos religiosos). Onde está afinal a identidade europeia/ocidental da Turquia?”[19]. Só havendo união civilizacional poderá haver crescimento.

Organizações como a NAFTA[20] ou áreas expansionistas como o Japão estão constantemente dependentes de terceiros, o que acaba por ser um entrave a essa união. No caso da organização é necessário o entendimento entre os três países, Canadá, EUA e México, de culturas diferentes. Os acordos vão sendo conseguidos, mas existe uma batalha constante para manter a confiança. Já com o Japão o problema que este é um país cuja sociedade e civilização é única. As diferenças culturais entre o Japão e outros países da Ásia - oriental são bloqueios à promoção de uma economia regional.

Asianização

O receio que o Ocidente tem em perder a posição dominante que possui tem vindo a crescer à medida que vários especialistas têm surgido que o futuro passe por uma asianização.

Tem-se observado ao longo da história que as regiões com maior poder económico alcançam uma supremacia a vários níveis. Nomeadamente nas áreas socioculturais, políticas, etc. Com essa supremacia, as regiões funcionam como “comandantes” dos restantes países.

O primeiro grande registo dessa supremacia aconteceu durante os descobrimentos, entre os séculos XV e XVI, com uma espécie de Europeização. Nessa altura, várias potências, especialmente Portugal, Espanha, Reino Unido e Holanda, tiveram a necessidade de explorar, pela força, os continentes africano, asiático e americano à procura de vários tipos de riqueza. Impondo a sua cultura, destruindo, por vezes, culturas autóctones e levando população como escravos e recursos naturais, o que lhes permitiu expandirem-se economicamente.

O “velho continente” continuaria a “comandar” o Mundo até às Grandes Guerras. Altura em que os EUA estavam em ascensão e aproveitando a destruição da Europa tornaram-se numa Grande Potência. Começou, assim, a Americanização do Mundo, com o reforço do papel do inglês no panorama mundial, que se acentuou com o aparecimento dos computadores, da informática, do audiovisual e com o desenvolvimento da aviação. Assim os EUA apareceram como um país extremamente terciarizado e com elevada inovação tecnológica e produtividade. Estes factores contribuíram para a expansão das empresas americanas no Mundo. Nomes como Mac Donalds, Pizza Hut, Coca-Cola, IBM, Microsoft, Boeing e Ford “invadiram-nos” com um sucesso espantoso.

Contudo, as recentes crises nos EUA e a elevada taxa de crescimento de países como a China e a Índia têm levantado dúvidas sobre quem será, num futuro relativamente próximo, o mais influente país do Mundo. Quem será a próxima Super Potência.

A influência asiática já começa a ser notada no dia-a-dia dos ocidentais. Actualmente já encontramos redes de lojas chinesas e indianas por todo o Mundo, extremamente bem organizadas e interligadas em redes multinacionais com grandes volumes de importações. Essas PME têm representado um papel importantíssimo para o crescimento das exportações e para a angariação de investimento directo estrangeiro para a Ásia. Os EUA e a Europa estão já bastante dependentes da China a vários níveis, entre os quais a elevada posse de títulos da dívida pública americana e europeia por parte de empresários chineses. Tudo isto concede a esses países um enorme poder de negociação a nível Mundial. A expansão chinesa alcançou valores impressionantes.

É a este poder que os países asiáticos exercem sobre o resto do mundo que se chama de asianização. A chamada ocidentalização, a meu ver, já se encontra numa fase de «aceleração negativa», proporcionalmente inversa à aceleração registada pela influência asiática.

O Ocidente deixa de ser a única civilização, como afirma Huntington, que tem interesses substanciais em todas as outras civilizações ou regiões e tem, ainda, a capacidade de afectar a política, a economia e a segurança de todas as outras civilizações ou regiões do planeta.


Serão os conflitos do futuro um espelho do passado, ou haverá mudanças nos motes dos choques civilizacionais? Essa é a questão que tento, com este trabalho, descortinar.

Inicialmente, diria que a resposta a esta pergunta seria simples. De certeza que haverá mudanças nos motes dos choques civilizacionais. Contudo, e após a leitura atenta da obra O Choque das Civilizações e a Mudança na Ordem Mundial e do debate homónimo, percebo que, apesar de uma certa mudança, a verdade é que serão de certo um espelho do passado.

De um lado temos o Ocidente unido através do cristianismo e do capitalismo, do outro, várias regiões que surgem agora unidas pelas suas crenças e cultura, como é o caso da Organização de Cooperação Económica, que agrega dez países muçulmanos não árabes: Irão, Paquistão, Turquia, Azerbeijão, Cazaquistão, Quirguistão, Turcomenistão, Tajiquistão, Uzbequistão e Afeganistão.

Como referi os confrontos irão começar nas linhas divisórias das civilizações, das suas fronteiras. Primeiro a um nível «micro», caracterizado por violência centralizada e disputa pelo território. E numa segunda fase, a um nível «macro». Caracterizado, sobretudo, por confrontos entre Estados de civilizações em “competição pelo poder militar e económico”[21] e tentando sempre passar à outra parte, e terceiros, os seus valores. Tanto políticos como religiosos.

Trazendo esta definição teórica para a realidade podemos falar do conflito israelo-palestiniano, luta armada entre israelitas e palestinos, sendo parte de um contexto maior («macro»): o conflito árabe-israelita.

Quem domina tende sempre a ver as outras civilizações sob o seu prisma e os seus modelos de vida. As superpotências, ao longo dos tempos, têm sido vistas como arrogantes, inflexíveis e destruidoras. Esta arrogância notou-se substancialmente durante o «reinado» de George W. Bush. A ignorância sobre o outro, e até de si próprio, leva de certo à decadência.

A visão americana, tão criticada, do “a América e o Mundo”, os discursos do presidente norte-americano como se fosse dono do Mundo e como se falasse por todos os cidadãos do planeta, foram marcando os dois mandatos daquele presidente e daquele povo.

Daí a luta constante de certas facções para «destronar» a Super Potência que é os EUA. Mas se passamos rapidamente de um ocidentalismo para uma asianização temos que ter em conta as mudanças quanto à forma de ver conceitos como o individualismo, liberalismo, constitucionalismo, direitos humanos, igualdade, liberdade, democracia, mercado livre, entre muitos outros.

O diário do planeta terra mostra que todas as grandes potências caíram e outras desmembraram-se. Roma e Grécia caíram com a perda de valores morais e sociais. Os Estados Unidos irão cair em breve, prevejo. Caso isso venha a acontecer de uma forma brusca, e passemos a estar sob uma asianização, será extremamente complicado para os ocidentais habituarem-se aos seus valores e instituições.

Para entender o futuro temos que olhar para trás e perceber aquilo que a história nos conta. Estou convicto de que podemos projectar o passado no futuro, mudando os actores, tecnologia e armamento existente. As causas dos conflitos serão cíclicas.

Em comparação com a obra de Samuel Huntington realço a minha distanciação enquanto às previsões futuristas para o mundo ocidental. Enquanto Huntington deixa no ar uma certa possibilidade de fortificação, muito devido à tentativa de modernização do mundo não ocidental. Em síntese, o Ocidente abriga a capacidade de inovação e, portanto, domina o processo de Modernidade. Mas o Ocidente já era Ocidente antes de ser Moderno.

As outras regiões não ocidentais tentam ser como a civilização ocidental Isto é, tentam ter o mesmo poder que os ocidentais têm. Daí adivinhar uma morte “rápida” do ocidente e uma ascensão “rápida” do oriente, mais propriamente da Ásia.

As guerras só terminarão quando cada indivíduo considerar a sua humanidade como a sua civilização. Talvez isso aconteça quando formos atacados por um bando de alienígenas sedentos de sangue humano, à boa maneira cinematográfica.

Bibliografia

esge/choque_civilizacoes.pdf. (s.d.). Obtido em Janeiro de 2009, de http://www.defesanet.com.br/: http://www.defesanet.com.br/esge/choque_civilizacoes.pdf

Estado-nação. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2.-2. [.-0.-1. (s.d.).

Fernandes, J. P. (2005). A Turquia: O Oriente que quer ser Ocidente? http://www.jptfernandes.com/docs/comunicacao_univ_coimbra.pdf. Coimbra.

Huntington, S. P. (2001). O Choque das Civilizações e a Mudança na Ordem Mundial (2ª Edição ed.). (H. M. Ribeiro, Trad.) Lisboa, Portugal: Gradiva.

O Choque das Civilizaçõess? O Debate (1º ed.). (1999). (H. M. Ribeiro, Trad.) Lisboa, Portugal: Gradiva.

wiki/Samuel_P._Huntington. (s.d.). Obtido em Janeiro de 2009, de http://pt.wikipedia.org: http://pt.wikipedia.org/wiki/Samuel_P._Huntington



[1] The Clash of Civilizations and the Remaking of World Order

[2] O choque de civilizações?

[3] O Fim da História e o Último Homem

[4] As Raízes da Ira Muçulmana

[5] (Ribeiro, 1999), pág. 7

[6] http://www.agenciafinanceira.iol.pt/noticia.php?id=1031317&div_id=1730; obtido em Janeiro de 2009;

[7] (Ribeiro, 1999), pág. 7

[8]A ideia de Estado-nação nasceu na Europa em finais do século XVIII e inícios do século XIX. Provém do conceito de "Estado da Razão" do Iluminismo, diferente da "Razão de Estado" dos séculos XVI e XVII. A Razão passou a ser a força constituidora da dinâmica do Estado-nação, principalmente ao nível da administração dos povos. A ideia de pertença a um grupo com uma cultura, língua e história próprias, a uma nação, foi sempre uma das marcas dos europeus nos últimos séculos, ideal que acabariam por transportar para as suas projecções coloniais. Há um efeito psicológico na emergência do Estado-nação, pois a pertença do indivíduo a tal estrutura confere-lhe segurança e certeza, enquadramento e referência civilizacional”. Em: (Estado-nação. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora)

[9] (Ribeiro, 1999), pág. 7

[10] Idem, pág. 9

[11] Ibidem

[12] (Zahar, Rio, 1963), pág. 100

[13] Inicialmente Huntington definiu como “confuciana”, mas acabou por denominar de “sínica”. Entendendo o autor que aquela civilização tem como Estado-Núcleo a China, mas mais que a China ou o Confucionismo abrange, pelo menos, as comunidades chinesas no sudeste asiático, a Coreia e, marginalmente, o Vietname, e outras religiões, além do confucionismo.

[14] (Ribeiro, 1999), pág. 10

[15] Ibidem

[16] Ibidem

[17] Ibidem

[18] (Fernandes, 2005), pág. 14

[19] Idem, pág. 9

[20] Área de Comércio Livre Norte-Americano (North American Free Trade Area)

[21] (Ribeiro, 1999), pág. 14

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